Jimpa - Seleção de Sundance Estreias
- Fernando Gomes
- 26 de jan.
- 3 min de leitura
Chegamos a um momento nas lutas por causas sociais em que as primeiras gerações a lutar por esses direitos podem se distanciar das causas pelas quais suas próprias comunidades lutam hoje. Essa é a premissa de Jimpa.
O longa acompanha Jim, ou Jimpa, um senhor gay com HIV que foi um advogado extraordinário pelas causas LGBT+ em sua época. Ele é visitado por sua filha, que tem uma visão idealizada do relacionamento de seus pais — um relacionamento que ela acredita não ter tido conflitos —, e por Frances, sua neta não binária.
Tematicamente complexo, o filme nos conduz por uma jornada em que Jim é incapaz de se conectar com Frances e suas lutas. Seja por conta dos pronomes, da identificação de gênero ou da sexualidade, para Jimpa essa ultraespecificação recai mais em uma não-preferência do que em uma preferência. Nas palavras dele, os jovens têm “termos demais para definir tudo” — um conceito que contradiz suas próprias concepções sobre o que é ser gay.
Esse conflito entre três gerações é cativante e intrigante do início ao fim. Ele coloca em oposição a personalidade abrasiva de Jim, a filha que se recusa a enxergar a falibilidade do pai, e Frances, alguém com muitas causas para lutar, mas incapaz de travar essas batalhas em um ambiente tão pessoal.
Jim é visto como uma figura heroica e admirável por Frances, mas essa imagem rapidamente começa a se desfazer. Afinal, como pode alguém que advogou, lecionou e viveu lutando pelos direitos de sua comunidade ser incapaz de exercer empatia pelas causas de Frances? Ou, mais importante, como pode alguém ser tão altruísta publicamente e tão inapto a lutar por sua própria família? Que tipo de pessoa consegue entregar tanto à comunidade e tão pouco àqueles mais próximos?
Ao mesmo tempo, vemos a relação de pai e filha, na qual fica evidente a incapacidade de Hannah de retirar o filtro de idolatria do pai. Brutalmente honesto, imperfeito e incapaz de admitir suas limitações, Jim é um homem deslocado no tempo: um ativista que, após vencer suas primeiras batalhas, não sabe pelo que lutar. Ele é paradoxalmente altruísta e egoísta, incapaz de acreditar nas lutas de outros.
Jimpa é um filme sobre a desconstrução de nossos pais. É sobre compreender que eles são seres humanos falhos, muitas vezes incapazes de nos entender, mas capazes de nos magoar. E que essas imperfeições não apagam o amor, o suporte, o apoio e a admiração que eles merecem.
Embora as faíscas do debate intergeracional sejam uma reflexão inteligentíssima, Jimpa é um filme pessoal demais. A história, que reflete a relação da diretora com o pai e traz a própria filha interpretando Frances, sofre pela dificuldade de construir um roteiro coeso. Isso ocorre porque, para qualquer pessoa — inclusive a diretora Sophie Hyde —, é impossível responder plenamente à pergunta: o que foi a sua relação com seu pai? Definir a mensagem e o sentido de um filme é muito mais simples do que definir a complexidade de uma relação.
Fica evidente que, ao revisitar suas próprias memórias, surge uma dificuldade insuperável em saber o que era irrelevante nessa relação. É como se fosse impossível dizer que certos aspectos das nossas relações paternas ou maternas são dispensáveis. Isso faz com que muitos debates, personagens e inserções acabem sendo abandonados ao longo do filme.
Apesar disso, o roteiro mantém você engajado. A intimidade e vulnerabilidade do texto são magnéticas, entregues com um senso de humor que traz leveza a temas complexos. A presença de Aud Mason-Hyde (Frances), pessoa não binária, como atriz e consultora, enriquece profundamente o debate, capturando reações universais desse grupo ao ouvir coisas similares.
Dito isso, Jimpa abre portas demais e não tem tempo de fechar a maioria. Mas, assim como sua própria mensagem — de que o imperfeito pode ser amado —, o filme também pode, mesmo com suas imperfeições.







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