top of page

Dead Lover — Seleção de Sundance Midnight

  • Fernando Gomes
  • 27 de jan.
  • 3 min de leitura

O impacto cultural de Mary Shelley, principalmente no que tange o terror, permanece criando obras em que morbidez, desejo e amor se encontram. “Dead Lovers” é o mais novo exemplo dessa influência, que, mesmo incorrendo no derivativo, encontra inventividade e comprometimento de sobra para criar algo original.


Grace Glowicki, diretora e protagonista, interpreta uma coveira que carrega um odor tão fétido e irremovível, por conta de seu trabalho, que afasta dela toda a possibilidade de encontrar um amor. Seu maior desejo é encontrar um amor que ela promete “nunca, nunca, nunca largar”, um sentimento que carrega certa universalidade. A sorte dela muda quando um homem finalmente consegue ver além de seu próprio olfato e amar a coveira. Esse amor é curto, pois o homem apaixonado promete dar tudo à coveira, que deseja “morrer nos braços do amor da vida dela e morrer juntos, num grande funeral com filhos, filhos dos filhos e filhos dos filhos dos filhos”. O problema é que o homem é infértil e, no retorno de uma viagem em que faz o tratamento, acaba morrendo.


A partir daqui, o filme vai acompanhar a coveira desafiando a morte através do amor, no formato de ressuscitar seu amor a partir de um dedo encontrado à deriva. Partes iguais Frankenstein, Monty Python e uma peça de teatro, a obra toca em temas como a permanência do amor após a morte, a alegria de possuir (mesmo que efêmera), a insanidade causada pela dor de perder e a ideia de que existe alguém para todo mundo.


Esse “terrir” comunica tudo isso de forma extremamente escrachada. O humor é constantemente absurdo e mórbido, muitas vezes caindo no repetitivo e mau gosto. Seu proveito do filme vai definitivamente depender da sua tolerância e do quanto as piadas vão conectar com você. Isso porque o filme parece preso em certos sketches por períodos de tempo, além de possuir humor e personagens unidimensionais demais. Por conta disso, a efetividade do texto vai progressivamente se esvaindo, mesmo com performances ultra-comprometidas de um elenco composto por apenas quatro pessoas.


Sob um orçamento limitado, Dead Lovers é um filme difícil de ser encontrado hoje em dia. Gravado completamente dentro de estúdio, várias decisões de composição na fotografia, como, por exemplo, a iluminação que constantemente contrasta personagens contra um fundo preto, a escolha de gravar em 16mm, o minimalismo dos sets e enquadramentos de proximidade escondem muitas dessas limitações. Isso concede ao longa uma teatralidade visual, mas também na atuação, onde pessoas correm de forma estática paralela à câmera para dar a ilusão de movimento.


Existe um mérito absurdo na exploração das possibilidades dentro das restrições que o filme enfrenta. E, nesse aspecto, Grace Glowicki e sua equipe criam algo admirável. Outro ponto que chama atenção vem nos momentos de vulnerabilidade e isolamento da protagonista, que comunica algo profundamente humano e universal na busca do amor. Mas isso não é o suficiente para desenterrar o potencial completo do filme de uma montanha de piadas de qualidade variável e do clima monótono que domina o filme da metade pra frente.


Dead Lovers, assim como sua protagonista, vai encontrar quem vá lhe amar de forma intensa, mas o formato atípico e o humor mórbido devem dissuadir muitas pessoas. No fim, foi uma experiência interessante que trouxe piadas e momentos fantásticos, porém a criatividade que permeia o filme tinha que transbordar para o texto também.

 
 
 

Comentários


Perifa Film

©2023 por PerifaFilm.

bottom of page